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Esta é a minha participação para a «Fábrica das Letras» neste mês de Setembro de 2010, que agora se inicia. O tema é LIVRE!
Quando em Agosto entrei no meu escritório/biblioteca na casa da minha mãe, em Trás-os-Montes, toquei e abri alguns livros, revi álbuns de fotografias e reli alguns papéis escrevinhados há anos.
Deixo-vos com uma carta. Tem um destinatário imaginário: sem idade, sem rosto, sem credo ou raça. Na altura em que a escrevi andava demasiado ocupada com as minhas leituras e outros escritos.
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Carvalhais, 14 de Fevereiro de 2001
ESSÊNCIA DA MINHA ESSÊNCIA
Depois da ausência inesperada, finalmente o reencontro infinitamente adiado... Sei que devia ter chegado antes, ter-me manifestado, porém retiveram-me onde eu já não era há tanto tempo... E ninguém sabia!
Como soubeste que me aprisionavam? Como conseguiste encontrar-me? Saberei ou saberás dizer-me como chegaste até mim?... Confesso-te que não sei... Pedes-me que te conte o que me habita... Só que é demasiado doloroso lembrar que na altura eras só essência e eu a sombra de mim mesma.
Fui Eurídice para que tu fosses Orpheu e me resgatasses das profundezas que me tragavam. Mantive-me atenta para sondar o mistério, para ouvir a melodia ténue das esferas, para te ouvir. Soube esperar e tu vieste. E não olhaste para trás como ele.
Foi a tua voz divina, sussurrada em silêncio que me devolveu o SER. Ouvi-a veladamente, mas soube que eras tu. Deixei então que me levasses para onde eu seria novamente.
Soçobram em mim, em ti tantos momentos sonhadamente oásis que a Hora não poderá nunca apagar... porque a poesia que nos habita é indecifrável... porque só na nossa exsitência azul o sabemos. Nós conhecemos o indizível.
Temos o mesmo olhar de opala, claro, límpido, como outrora. É de ouro a claridade que nos une, porque tudo em nós é paisagem... etérea. Somos impensadamente melodias do SER. A ESSÊNCIA que somos poucos a sabem. A maioria desconhece-a nós não, porquanto saibamos que antes do reencontro houve duras provas a enfrentar. E que provas dolorosas conhecemos, meu amor...
Agora somos indefinidamente SEM TÍTULO e só UNIVERSO. Somos na nossa grandeza a anunciação da aurora sagrando de eternidade os que se amam.
Sempre.
Marília
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Nota:
1- Mantive o nome imaginário do remetente.
2- Se não puder participar com este texto por ser de 2001, logo, logo participarei com outro.