quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Paisagens

Quem me dera acordar gaivota
livre de preocupações metafísicas
e pensamentos alados de angústia

Ter o céu só e sem limite
e as escarpas do mar como abrigo
para carpir as minhas mágoas
e esquecer os estados febris
Depois de muitos sóis
por onde viajei na brisa do vento
encanto-me sempre com o entardecer
de nuvens em farfalhos
e adormeço
talvez um dia eternamente

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Nota: Fotos de F Nando

domingo, 26 de setembro de 2010

Números simpáticos

Foto de FNando

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No Dicionário de Símbolos podemos encontrar a descodificação de palavras e números; isto é, o seu significado enquanto símbolos. Não vou fazer uma dissertação sobre símbolos neste post. Vou muito simplesmente escrever sobre o que alguns números significam para mim, sem carácter científico, portanto. Embora conheça o seu significado aplicado à literatura.
Gosto do número três. Acho-o um número forte, espiritual e poético. A seguir, vem o número sete. O que vejo nele? Sonho, esoterismo, fantasia. Tem feito parte da minha vida. Segue-se-lhe o número treze. Sim, o número treze e se coincidir com uma sexta-feira melhor. Acho-o também poderoso, mágico, guerreiro. Não acredito em mitos que o apelidam de "o número do azar".
Há mais algum número de que goste? Não! Já identifiquei os meus números de eleição. Então que faz aquele número duplo, em azulejo, a abrir esta reflexão sobre números? Não gosto particularmente do número quatro. Mas sempre achei o número quarenta e quatro simpático. Dois quatros. Um significado que vem de uma brincadeira de adolescentes.
Já lá vai o tempo em que eu e as minhas amigas jogávamos um jogo com os números de matrícula de automóveis que se repetiam e, para mim (imagino que para todas), o número quarenta e quatro era o preferido. O número onze correspondia a "Vais receber uma carta", o vinte e dois "Vais ter boas notas", o trinta e três já não me lembro (não devia ser nada de bom, pois também havia significados negativos), mas nunca esqueci o significado que atribuímos ao simpático número. Nós, jovens sonhadoras, românticas, procurávamos esse simpático número em cada automóvel que passasse por nós. Ficávamos felizes, pois era o melhor de todos e que enchia o nosso coração de expectativa... "Alguém te ama!" Não nos interessava saber quem. Ele, o príncipe desejado, acabaria por chegar e por nos fazer muito felizes.
Hoje continuo a dar-lhe imaginariamente esse significado quando o vejo na matrícula de um automóvel. É um número simpático. Hoje é um número FELIZ!

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Amor de irmãos

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Este é o meu irmão e uma das cockers spaniel, a Sisse. Adora animais e se pudesse teria outros, passa algum do seu tempo, especialmente ao fim de semana, a tratar dos jardins e da horta.
É o meu ombro amigo, o meu porto seguro e tem-me ajudado muito há já alguns anos. O seu lado pragmático atenua o meu lado demasiado emotivo. Ainda assim não consigo deixar de sofrer por antecipação.
O meu irmão tem a força, a coragem, o carácter do nosso pai. Imagino que se fosse vivo teria muito orgulho nele, tal como eu tenho. É empreendedor, workaholic, tem sempre um novo projecto em mente que executa assim que pode. Subiu a pulso na empresa onde trabalha demonstrando sempre disponibilidade, responsabilidade, assertividade na tomada de decisões. Por issso vamos ficar tão longe. O Oceano Atlântico vai separar-nos. A empresa onde trabalha envia-o para Manaus, na Amazónia, para abrir uma fábrica de componentes de automóvel.
Já me sinto desamparada antes mesmo da sua partida, na próxima segunda-feira. Lá se vai o meu "mano", como costumo chamar-lhe, por ser mais novo que eu, numa altura em que não me tenho sentido bem. Ando triste e perdida.
Para me animarem, os meus/nossos amigos dizem: "Podes ir visitá-lo ao Brasil!", como se o Brasil fosse logo ali. Porém se ficar lá dois a três anos, acabarei, com certeza, por ir. Este meu mano é tudo para mim. Depois da morte do nosso pai e do aparecimento da minha doença crónica, que me vai empurrar para a reforma antecipada, ele é a nossa referência masculina, minha e da minha mãe.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Saudades da BlogGincana antes de dizer adeus

Esta é a minha participação na BloGincana de Setembro de 2010.
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É curioso ver que a Natureza se renova sempre, mesmo quando o Outono vem e as folhas das árvores caem ou quando no Inverno ficam despidas. Fecha-se um ciclo para dar lugar ao próximo que virá. O tempo de uma nova vida, o acordar lento e doce de uma outra Natureza. É na Primavera que tudo acontece.
O Mundo desde que é Mundo é protagonista de nascimentos e mortes. Plantas, animais, civilizações inteiras, homens, mulheres, crianças.
A "morte não pode ter razão sobre a vida" (Vergílio Ferreira) dizem os existencialistas. Mas tem. Porque é o caminho final para o qual todos nos dirigimos. Um dia deixamos de existir. Que acontece depois? Ninguém sabe. Eu, pelo menos, não sei.
Nem pretendo saber.
Este Verão, enquanto descansava alguns dias em Marvão, visitei as ruínas romanas de Ammaia. Fiquei fascinada pela beleza e quantidade de vestígios que ali pude observar. Não sendo uma entendida no assunto, imaginei diferentes espaços: saunas, salas, páteos, oficinas; festas, encontros secretos, aulas de filosofia ao ar livre...
Que me deu para me pôr a sonhar? As escavações tinham sido interrompidas por falta de verba, como me disseram na recepção. Havia ainda tanto a descobrir! Notava-se isso mesmo no terreno. Havia uma parte das escavações coberta, bem protegida.
Ontem Ammaia era uma polis, tem todas as características para o ter sido devido à sua dimensão. Hoje são só ruínas que encanta quem as visita.
Os Romanos morreram, deixando o testemunho
da sua passagem em diferentes pontos de terras lusas.
São ruínas, apenas ruínas para alguns porque onde não há vida não há mais nada. Não tem valor!
Aqui respira-se História. Só os mais incultos pensam de outra forma.
Haverá outro tipo de ruínas? Ou as ruínas são mais do que pedras? Talvez! Haverá outro tipo de morte?
Sim. A das palavras. A da partilha da resposta aos desafios da BloGincana.
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Nota: Fotos de FNando

sábado, 18 de setembro de 2010

Queria ser...


Foto de F Nando

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Queria ser sempre para mim
a que sou para ti
nos meus melhores momentos
quando penso e sinto apenas


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Encho as tuas folhas
de palavras e cores que desabrocham
desarmadas e puras
nas minhas longas vigílias


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Deixo-me guiar enfeitiçada
pelas ondulações dessa minha outra voz
por esse eu maior


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Sabe-me a minha poesia
a transparências do ser
a encontros de palavras orvalhadas
onde cintilam ainda gotas azuis


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04-08-1999

domingo, 12 de setembro de 2010

Reinventem-me

Foto de F Nando
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Quero ser estátua
mas não uma estátua qualquer
Serei de material nobre
e burilada com o amor do escultor
Serei «Sem título"
para que todos me reinventem
Estarei num lugar mágico
e nunca mais me poderão menosprezar
Estarei voltada para o mar
para ver os barcos sair e entrar no porto
O sol e a chuva
dar-me-ão a honra da sua visita
O vento fustigar-me-á no inverno
e as gaivotas poisarão em mim para descansar
As estátuas são estátuas
não sofrem, nem sentem nada

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Maísa

Foto de F Nando
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Uma dor funda, aguda, inquietante apoderou-se de Maísa logo pela manhã dilacerando-a. O dia primaveril estava cheio de promessas. A natureza renovava-se e até o mar estava mais tranquilo. Respirava a harmonia em seu redor, porém não a sentia no seu interior. Estava dopada pela medicação. Os pensamentos não eram nítidos.
Lembrava-se que na noite anterior, depois de muito chorar por não achar um rumo para a sua vida, se encharcara de álcool e muitos medicamentos. Ainda estava de ressaca! Não sabia como chegara ali, só e conduzindo. Lembrava-se, no entanto de ter dado meia volta, quando chegara ao local de trabalho e não conseguira sair do automóvel por causa das lágrimas. Fizera exercícios de respiração, mas de nada adiantara. Pensamentos atrozes e maquiavélicos cruzavam a sua mente.
Era melhor para todos que ela não fosse mais. Para ela também. Descansaria, por fim. Acabaria a agonia, a angústia, o desespero, as lágrimas. Tudo terminaria. Tudo. Tudo.
Maísa só podia refugiar-se num local. E era aí que pensava acabar coma a vida. Levou os mais variados químicos prescritos pela médica assistente e whisky suficiente. Nem deu conta quando a maré encheu e a arrastou para alto mar. Aquele tinha sido o fim desejado: não iam as cinzas; ia o corpo... para se fundir nas águas do mar!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Um simples saco de papel...

Tenho por hábito guardar alguns sacos de papel dando-lhe as mais variadas finalidades. A maior parte das vezes acabam na reciclagem do papel depois de os ter usado e usado. Ficam amarrotados, amachucados e , ainda que com pena, digo-lhes adeus enchendo-os com os panfletos de publicidade com que "atulham" as nossas caixas de correio.
Certo dia, não sei precisar onde, nem quando, veio parar-me às mãos este saco delicioso. A história é simples mas linda e cheia de significado.


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PS- Ainda mantenho o saco.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Difícil de Aceitar

Gostava tanto do que fazia no seu trabalho. Trabalhava em equipa com as colegas e amigas que , hoje, raramente vê, mas com quem se comunica, de vez em quando. Foi até trabalhar para o estrangeiro e, no regresso, logo se sentiu perdida e insegura. Ainda assim, trabalhou, sem necessidade, as férias todas. Nos momentos de maior quantidade de trabalho nem descansava, fazia directas. Era já a fase da "mania" e da "obsessão". Depressa mudaria para as lágrimas e, anos mais tarde, para os ataques de pânico, a angústia, os desmaios, as faltas de ar, a incapacidade de transpor a porta não obstante estar pronta para o fazer.
Tudo começou pelo diagnóstico de uma depressão que não foi tratada, por vontade da paciente que achou que daria conta do problema sozinha. Seguiu-se-lhe a perda total da auto confiança e pouco tempo depois teve um esgotamento que a levaria à cama por um período de sete meses. Havia cura? A família achava que sim. Aliás não compreendiam muito bem o que se passava com ela. Tinha tudo. Fisicamente estava bem! Não havia razão para estar a viver estas crises.
Porém o seu estado de infelicidade, desespero, angústia, abulia aumentava. Saía de casa para o trabalho, mas em vez disso ia chorar para a beira rio e, em casa, mantinha um diário onde contava os seus desconcertos. Até que, não aguentando mais, tentou pela primeira vez (pois haveria outras) o suicídio. O irmão socorrê-la-ia à distância e ela terminaria internada num hospital psiquiátrico.
Procurou outros médicos, outras terapias, até que lhe foi diagnosticada esta doença do foro mental: depressiva bipolar/maníaco-depressiva. Fez-se sócia da ADEB (Associação de Apoio aos Doentes Depressivos Bipolares) onde, às vezes, vai aos encontros, às sessões psicopedagógicas, às terapias de grupo.
Se a família levou anos a "acreditar" nesta doença mental e nos seus efeitos, os seus amigos nem acreditam nesta doença tão perturbadora e que causa tanto sofrimento a quem a padece. Fisicamente pode-se estar muito bem (?), às vezes finge-se, mas é na mente e nos pensamentos tortuosos que tudo acontece. Estas pessoas são seres frágeis, com alteração de humor, que cometem as maiores atrocidades (gastos excessivos; condução perigosa; abuso do álcool; destruição de objectos em casa,...)
Não há cura. Há medicação que ajuda a estabilizar estes altos e baixos e, ainda assim, nem sempre se consegue esse equilíbrio.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sem Título e só Universo

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Esta é a minha participação para a «Fábrica das Letras» neste mês de Setembro de 2010, que agora se inicia. O tema é LIVRE!

Quando em Agosto entrei no meu escritório/biblioteca na casa da minha mãe, em Trás-os-Montes, toquei e abri alguns livros, revi álbuns de fotografias e reli alguns papéis escrevinhados há anos.

Deixo-vos com uma carta. Tem um destinatário imaginário: sem idade, sem rosto, sem credo ou raça. Na altura em que a escrevi andava demasiado ocupada com as minhas leituras e outros escritos.


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Carvalhais, 14 de Fevereiro de 2001


ESSÊNCIA DA MINHA ESSÊNCIA


Depois da ausência inesperada, finalmente o reencontro infinitamente adiado... Sei que devia ter chegado antes, ter-me manifestado, porém retiveram-me onde eu já não era há tanto tempo... E ninguém sabia!

Como soubeste que me aprisionavam? Como conseguiste encontrar-me? Saberei ou saberás dizer-me como chegaste até mim?... Confesso-te que não sei... Pedes-me que te conte o que me habita... Só que é demasiado doloroso lembrar que na altura eras só essência e eu a sombra de mim mesma.

Fui Eurídice para que tu fosses Orpheu e me resgatasses das profundezas que me tragavam. Mantive-me atenta para sondar o mistério, para ouvir a melodia ténue das esferas, para te ouvir. Soube esperar e tu vieste. E não olhaste para trás como ele.

Foi a tua voz divina, sussurrada em silêncio que me devolveu o SER. Ouvi-a veladamente, mas soube que eras tu. Deixei então que me levasses para onde eu seria novamente.

Soçobram em mim, em ti tantos momentos sonhadamente oásis que a Hora não poderá nunca apagar... porque a poesia que nos habita é indecifrável... porque só na nossa exsitência azul o sabemos. Nós conhecemos o indizível.

Temos o mesmo olhar de opala, claro, límpido, como outrora. É de ouro a claridade que nos une, porque tudo em nós é paisagem... etérea. Somos impensadamente melodias do SER. A ESSÊNCIA que somos poucos a sabem. A maioria desconhece-a nós não, porquanto saibamos que antes do reencontro houve duras provas a enfrentar. E que provas dolorosas conhecemos, meu amor...

Agora somos indefinidamente SEM TÍTULO e só UNIVERSO. Somos na nossa grandeza a anunciação da aurora sagrando de eternidade os que se amam.


Sempre.

Marília

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Nota:

1- Mantive o nome imaginário do remetente.

2- Se não puder participar com este texto por ser de 2001, logo, logo participarei com outro.